NOTÍCIAS



Especial

Além do filtro: a luta de Tainá Chiarello contra a escuridão


Neste Setembro Amarelo, Tainá mostrou como transformou a dor em alerta e esperança.

Por Lucas Villiger
18/09/2025 às 05h30 | Atualizada em 18/09/2025 - 09h56
Compartilhar


Havia nas minhas anotações um rascunho de uma vida perfeita — fotos de bolos, receitas meticulosamente deliciosas, risos em eventos, um feed com 25 mil seguidores que aplaudiam cada conquista. Tainá Chiarello, aos 28 anos, parecia a obra-prima que as redes sociais vendem: bonita, casada, bem-sucedida, talentosa. Mas a perfeição que se vê na tela do smartphone não revelou o labirinto onde ela caminhava sozinha.

Hoje conto a história de Tainá num dia nublado que, por ironia do calendário, encontra em setembro um nome e uma cor para lembrar que a vida às vezes pede socorro: Setembro Amarelo. Ela aceitou falar comigo com calma e verdade — e transformar dor em alerta, e alerta em esperança.

“Desde que eu venci o Que Seja Doce, em 2022, eu comecei a ser muito ativa nas redes sociais”, disse Tainá, com a voz que alternava entre o firme e o suave. O Instagram, explicou, era um mar de rosas cuidadosamente semeadas: rotina, trabalho, academia, posts “por obrigação”. O que parecia frutificar reconhecimento, por dentro, secava.


A sobrecarga veio devagar como uma maré alta. Havia a Síndrome de Burnout, a dificuldade em dizer não, o desejo de abraçar o mundo; havia ainda uma relação cruel com o próprio corpo. “Eu sempre me via maior do que eu realmente sou”, contou. A obsessão por perder peso empilhou horas e suor na academia — e, pouco a pouco, tirou-lhe o fôlego da alma.

Em 2024, os preparativos do casamento funcionaram como um espelho que refletia expectativas ampliadas. “Eu não quis fazer uma festa de casamento, eu quis fazer umas 12 festas, tudo para mostrar para as pessoas”, confessou. O esforço gigantesco de cumprir imagens alheias junto à rotina frenética do trabalho fez surgir crises de ansiedade. Procurou ajuda: até os dias de hoje faz terapia com a psicóloga Aline Hanauer e é acompanhada pelo psiquiatra Douglas Manfré. Mas ainda assim, veio a queda.

“Em janeiro deste ano, no meu trabalho na cafeteria, eu fiquei por uns 30 minutos olhando para o nada… foi como esquecer de tudo e no mesmo dia pedi para me afastar.” O afastamento foi o primeiro passo rumo a um silêncio que se tornou cárcere. Isolou-se, deixou de comer, perdeu 10 quilos, mal bebia água. Até a noite mais escura: “Um dia, depois de sentir um vazio tão profundo, eu tomei remédios para não acordar mais.” Tainá tentou tirar a própria vida.

Ela acordou, pois o destino tinha outros planos para Tainá. Pela graça, pela intervenção do marido Augusto, pela família e amigos que formaram uma rede ao redor dela, Tainá despertou para o que, mais tarde, seria sua decisão de resistência. “A única pessoa que pode me tirar do buraco sou eu mesma, então eu disse ‘CHEGA’ e decidi que iria melhorar, afinal eu tenho saúde, família, tenho tudo, só depende de mim”, falou, com uma mistura de firmeza e humildade que não se aprende — encontra-se.


Da terapia, veio o diagnóstico que nomeou a dor e a tornou tratável: Síndrome de Burnout. Do acompanhamento médico, vieram remédios quando necessários, orientações e um plano. “Terapia pra mim é o Top 3 itens necessários para viver”, afirmou com convicção — e agradeceu a quem esteve ao lado, lembrando que não existe herói que se cura sozinho.

A voz de Tainá, hoje, carrega cicatrizes que não apagam histórias; leva também planos: “Vem muitas novidades por aí, fiquem ligados!” E manda um recado direto a quem vive o mesmo silêncio: “Ninguém tá 100% bem — respira fundo, dorme, e você verá que talvez o problema não seja tão grande assim. Pode parecer clichê, mas depois da tempestade o sol aparece. Não se isole, não tenha vergonha e procure ajuda.”


Ao ouvir Tainá, percebi que a história dela não é apenas sobre uma influencer que caiu e voltou — é sobre pessoas comuns que atravessam noites escuras. É sobre a pressão de mostrar felicidade como produto; sobre o preço invisível de ser admirado sem ser conhecido; sobre a urgência de falar quando o peito aperta.

Setembro Amarelo nos chama para isso: olhar, perguntar, escutar. Sinais como isolamento, perda ou ganho de peso acentuados, fadiga constante, perda de interesse em atividades antes prazerosas, fala sobre desesperança ou sobre não querer mais viver, merecem atenção imediata. Se você, leitor, perceber alguém assim — um colega, um parente, um amigo — estenda a mão sem julgamento. Se você se reconhecer nas palavras de Tainá, saiba que pedir ajuda é coragem, não fraqueza.


Tainá escolheu recomeçar. Não apagou as feridas; aprendeu a cuidar delas. E hoje compartilha sua história para que outros não se sintam sozinhos na noite. Em seu feed, entre receitas e sorrisos, há agora uma honestidade que alimenta mais do que sobremesas: alimenta esperança. Em fevereiro, Tainá postou um vídeo explanando sua real situação, onde alcançou mais de 26 mil pessoas e tocou corações.
 
Como jornalista e como alguém que testemunhou a verdade desta entrevista, encerro com um apelo simples e urgente: fale. Pergunte. Ofereça companhia. Procure um profissional de saúde mental se você ou alguém próximo estiver sofrendo — terapia, acompanhamento psiquiátrico e redes de apoio salvam vidas. Setembro Amarelo é um lembrete de que, mesmo nos dias mais escuros, a humanidade de um abraço e o cuidado em ouvir podem reacender a luz da vida.




Se você está em sofrimento ou pensa em se machucar, procure imediatamente serviços de emergência ou profissionais de saúde. Conversar com alguém de confiança e buscar ajuda profissional são passos essenciais. Se precisar ser ouvido, o CVV responde gratuitamente, basta ligar 188. Você não está só.  


Confira o áudio:





SEJA O PRIMEIRO A COMENTAR




VEJA TAMBÉM